Crianças passivas, que esperem quietinhas até os adultos lhes dizerem o que fazer e de que forma se manifestar. Difícil presenciar ou mesmo imaginar isso hoje em dia, não é? Atualmente, é cada vez mais comum vê-las expressando seus sentimentos e gostos desde muito novinhas e tomando iniciativas assim que conquistam alguma autonomia (habilidade motora ou capacidade de organização, por exemplo). Não que sejam completamente independentes – todo filho gosta do apoio dos pais –, mas elas deixaram de ser coadjuvantes. O protagonismo infantil é uma realidade que veio para ficar na sociedade e nas relações familiares.
“É como se as crianças de hoje nascessem com um chip diferente”, ilustra a psicóloga infantilDaniella Freixo de Faria, que explica: “Elas já chegam entendendo limites de respeito, de relacionamento. Não recebem mais tudo pronto. Se manifestam e, por isso, são muito mais convidadas a fazer parte do processo social. A gente constrói um caminho em que o adulto e a criança andam juntos”.
A pedagoga Viviane Drumond, professora do curso de Pedagogia da Universidade Federal de Tocantins (UFT), ressalta que esse fenômeno ganhou força também por causa de avanços como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “Leis específicas ajudam a criança a ser vista como um ser que realmente integra a sociedade, que tem direitos. Como cidadã, ela é estimulada a se expressar”, afirma.
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Assim, meninas e meninos deixam claro a que vieram. Têm noções políticas antes de completar dez anos de idade, fazem planos para transformar seus hobbies em algo maior que a diversão, se organizam para defender seus interesses e viabilizar seus sonhos. “Elas são capazes, criativas e trabalham as ideias de maneira mais livre. Podem até começar uma atividade por brincadeira, mas são sérias no sentido de levá-la adiante como representação do que sentem, do que gostam. Às vezes, os papeis se invertem, e os adultos tornam-se os coadjuvantes”, conta Viviane.
Com a mão na massa
Foi justamente no clima de brincadeira com o pai na cozinha que a chef mirim Rebeca Chamma, de dez anos, revelou seu gosto por culinária. A partir dos quatro anos, ela começou a ajudá-lo no preparo de pratos simples e mostrou uma aptidão nata para o negócio. O público teve acesso a esses momentos em vídeos postados pela família no YouTube, e a garota sentiu-se cada vez mais estimulada a exibir sua paixão pelas receitas. “Sempre gostei muito de cozinhar. Eu era pequena, mas sabia disso. Acho que chamei a atenção por fazer tudo com muita naturalidade e alegria”, analisa.
Com a ajuda dos pais e de editores, em 2011 a pequena chef lançou seu primeiro livro de receitas, “Na Cozinha da Rebeca – Aventuras Culinárias para Crianças Extraordinárias” (Ed. Alaúde). O segundo, “Festa da Rebeca – Receitas Deliciosas para Muita Diversão” (Ed. Alaúde), chega às prateleiras neste mês. E ela ainda tem fôlego para comandar o quadro televisivo “Cozinha da Amiga Zazá” no “Cocoricó”, ir à escola de manhã e frequentar aulas de canto, teatro e natação.
Diante de tantas conquistas a partir daquilo de que mais gosta, Rebeca sonha alto para o futuro: “Quero um dia ser como o [chef inglês] Jamie Oliver, uma pessoa que venceu cozinhando. Ele é meu ídolo e, quando eu conseguir falar inglês bem, vou querer conhecê-lo”.
Articulação entre amigas
O inglês precisará estar bem afiado também quando Joana, Marcela, Estela e Giovanna, todas com 12 anos, conseguirem juntar dinheiro suficiente para fazer uma viagem à Disney – motivo da realização, desde 2009, do Bazar Pop Camelô, inspirado nas vendas de garagem que sempre aparecem em filmes e seriados de TV norte-americanos. A ideia nasceu em 2007, quando as amigas se viram sem condições de comprar presentes para o Dia das Mães. Não deu para colocá-la em prática a tempo e, quando saiu do papel, o plano já havia mudado.
No começo, a ajuda dos pais foi fundamental. “Eles providenciaram a verba para o aluguel das primeiras mesas do bazar, que hoje somos nós que bancamos. Depois soubemos que eles achavam que estávamos brincando. Mas, mesmo assim, nunca deixaram de nos apoiar”, lembra Joana Fusco.
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A iniciativa enche as amigas de orgulho. “Decidimos tomar a frente da situação para termos um dinheiro nosso, conquistarmos essa viagem com o nosso esforço. Aprendemos muito nesses três anos: o valor do trabalho, a dificuldade para fazer uma compra grande. Ficamos mais maduras”, avalia. E o saldo disso tudo não será apenas financeiro, como Joana garante: “Depois dessa experiência, quando já tivermos voltado da Disney, vou querer continuar fazendo algo de que me orgulhe. Nós, crianças e adolescentes, temos um papel a exercer na sociedade”.
As dificuldades dos adultos
Nem todos os adultos, segundo a pedagoga Viviane, enxergam a relevância social da atuação das crianças. “Muitos não têm paciência, não param para prestar atenção nos mais jovens. Veem as crianças como um ‘vir a ser’, como se elas já não fossem, no presente”, diz. “É preciso ouvi-las e apoiá-las, para que elas possam colocar em prática suas ideias. As crianças podem, sim, ser agentes de transformação social”, defende.
No âmbito familiar, o protagonismo infantil também tem feito diferença, embora alguns pais não saibam ainda lidar com ele. A psicóloga Daniella esclarece: “Os adultos gostam de ver que seus filhos têm voz ativa e opinião, mas se assustam. O limiar entre a autoridade positiva e a perda de respeito é muito frágil, então os pais que não estão seguros preferem agir com autoritarismo e não conseguem fazer a relação fluir”.
Para ela, o posicionamento infantil diante dos mais variados assuntos é “uma qualidade evolutiva da humanidade” que deve ser aproveitada ao máximo por toda a família. “Hoje, os filhos fazem parte do desenvolvimento dos pais e vice-versa. É uma troca, estão todos lado a lado. Diferentemente de antigamente, as crianças são grandes contribuintes para a união familiar e o desenvolvimento do adulto”, finaliza.
fonte: igdelas
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